quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Rafael Leitão heptacampeão brasileiro

Acabou neste domingo (25) o 81º Campeonato Brasileiro Individual Absoluto de Xadrez. A prova foi disputada no sistema todos contra todos em João Pessoa desde o dia 17. Esta foi a terceira vez que a capital paraibana sedia a prova (já o havia feito em 1976 e na 80ª edição em 2013).
O grande mestre Rafael Duailibi Leitão, do Maranhão, sagrou-se campeão da prova, com 9½ pontos conquistados nas onze rodadas disputadas (campanha invicta com +8=3). Este foi o décimo-quinto Brasileiro que Leitão disputou e seu sétimo título. Com isso ele se iguala a João de Souza Mendes, Jaime Sunyé Neto e Giovanni Portilho Vescovi como recordistas de títulos nacionais (Walter Oswaldo Cruz e Gilberto Milos Júnior conquistaram seis títulos cada). Além do título e consequente premiação, Rafael colheu quatro pontos de rating. Os destaques de sua campanha ficam para as vitórias sobre o grande mestre Felipe de Cresce El Debs e sobre o mestre Fide Matheus Nakajo de Mendonça.
El Debs terminou na segunda colocação, a meio ponto do campeão (+8=2-1). O destaque de sua campanha foi a vitória sobre o também grande mestre Krikor Sevag Mekhitarian logo na rodada inaugural. Este foi o quinto Brasileiro de Felipe e sua melhor colocação (ele é o único gm brasileiro a nunca ter sido campeão nacional).
Mekhitarian, teve um mau começo, perdendo as duas primeiras rodadas (a segunda para o mestre internacional Máximo Iack Macedo), mas se recuperou ao longo da prova, terminando na terceira colocação com 7½ (+6=3-2). Este foi o décimo Brasileiro de Sevag, fazendo dele o 32º jogador a completar dez participações.
Mendonça, com 7 (+5=4-2), foi o quarto. O desempenho lhe valeu a conquista de sua segunda norma de MI, com destaque para a vitória no confronto direto da última rodada com o mestre Fide Edgar Rodrigues que também lutava pela norma. Este foi o segundo Brasileiro de Nakajo (no primeiro, na 79ª edição da prova, terminou em terceiro e também conquistou norma de MI).
Rodrigues, com 6 (+4=4-3) ficou em quinto, ficando a um ponto da norma de MI. Uma bela estreia para Edgar!
O mestre Fide César Hidemitsu Umetsubo foi o sexto, com 5½ (+3=5-3), em seu segundo Brasileiro consecutivo. Em sua estreia havia terminado na terceira colocação.
Três jogadores dividiram a sétima colocação com cinco pontos: o mestre Fide Francisco de Assis Cavalcanti (+2=6-3), o mestre internacional Máximo Iack Macedo (+3=4-4) e o mestre Fide Paulo Fernando Jatobá de Oliveira Reis, listados pela ordem do desempate. Cavalcanti é um veterano de oito participações. Iack completou sua quinta Final, a terceira seguida. Reis, vencedor da Semifinal Norte/Nordeste, também fez sua quinta participação. Além de lutar contra a maldição da semifinal (tradicionalmente o vencedor da semifinal tem um mau desempenho na final), Jatobá ainda teve que lidar com o extravio de sua bagagem no percurso entre Salvador e João Pessoa! Vale registrar que o vencedor da outra semifinal (que engloba as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste), o grande mestre Everaldo Matsuura abriu mão de sua vaga devido ao conflito de datas entre o Brasileiro e o Festival de Florianópolis, em que Everaldo já tinha confirmado participação antes do Brasileiro ser remarcado.
O mestre Fide local, Luismar Jorge Brito, terminou na décima colocação com 3½ (+1=5-5). Foi apenas seu quinto Brasileiro (terceiro consecutivo). Brito certamente poderia ter participado de muito mais não tivesse residido tantos anos fora do Brasil.
Na décima-primeira colocação terminou o mestre Fide potiguar Roberto Luiz Costa Andrade, outro veterano jogador que, no entanto, surpreendentemente fazia sua estreia na prova. Andrade conquistou três pontos (+1=4-6).
O estreante baiano Mario Henrique Andrade Fiaes completou a tabela com onze derrota e nenhum ponto. Nas 1329 participações da história do Brasileiro, esta foi apenas a 12ª vez que um jogador perde todas as suas partidas. A última vez havia sido no Brasileiro de São José do Rio Preto, em 2005, disputado pelo sistema suíço, com Toshinobu Tasoko. Toshi é um forte amador que viveu sua melhor fase enxadrística na primeira metade da década que inaugurou este milênio. Em Itabirito, 1998, disputado pelo sistema de matches eliminatórios, Gerson Peres Batista e Vinicius de Abreu Marques perderam as duas partidas de seus respectivos matches. Em Bebedouro, 1991, disputado pelo mesmo sistema de Itabirito, foi a vez de Wagner Martins Madeira e Eduardo Arruda Cunha perderem as duas partidas de seus matches. Em João Pessoa, 1976, disputado pelo sistema suíço, Gerardo Frota Jr, perdeu nas duas primeiras rodadas, ficou bye na terceira e então abandonou a prova. Em Fortaleza, 1960, num sistema Schurig inicialmente com 16 jogadores, o capixaba Creso Euclides abandonou a prova após perder seis partidas não completando o mínimo de 50% de participação para que suas partidas fossem computadas na classificação final. No Rio de Janeiro, 1956, João de Souza Mendes, defendendo o título, abandonou a prova após perder na primeira rodada. Na mesma cidade, em 1950, Mário Bawden abandonou após perder na primeira rodada, enquanto o local Ary Camargo Silveira perdeu todas as suas onze partidas (em realidade ele teria treze neste torneio mas Bawden e Trompowsky abandonaram antes da rodada em que enfrentariam Silveira). Já em Nova Friburgo, 1945, pelo mesmo sistema mas com apenas sete participantes, Paulo Duarte Fo perdeu todas as suas seis partidas. Considerando os diferentes sistemas de disputa e a quantidade de participantes, o desempenho de Fiaes neste ano é comparável apenas ao de Silveira em 1950!
A arbitragem esteve a cargo do árbitro Fide Máximo Igor Macedo.
O nível técnico da prova foi bom apesar da clara diferença entre os GMs e os demais participantes. Iack , o único MI, ficou abaixo do esperado. Talvez a presença de mais um GM e consequente chance de norma lhe desse a motivação extra necessária para melhorar seu desempenho. Nakajo mais uma vez mostrou seu grande talento e pode ainda vir a progredir muito, especialmente se decidir dedicar-se exclusivamente ao xadrez. Hoje, sua prioridade é o curso de Engenharia na Escola Politécnica da USP. Edgar teve uma boa estreia e é outro que tem muito a progredir com a experiência. Umetsubo não conseguiu repetir o desempenho do Brasileiro anterior mas tem tudo para se tornar um habitué. Jatobá provavelmente é hoje o jogador mais forte da Bahia e o mais forte candidato a MI do nordeste. Poderia ter se saído melhor. Qualquer um do trio de veteranos Cavalcanti, Brito e Andrade é um digno participante mas o fato dos três terem se classificado no mesmo ano (Cavalcanti foi convidado pela organização) é um sinal de quão pouco valorizado o Brasileiro está. Sobre Fiaes, o paragráfo anterior basta para a análise de seu desempenho. Vale, no entanto, ressaltar que ele se classificou em total acordo com as regras atuais.
Para melhorar o nível técnico há diversas ações que poderiam ser tomadas. Tornar o torneio mais atrativo é a principal delas. Atualmente a maioria dos GMs brasileiros sequer tenta classificar-se para a prova. Há duas maneiras de tornar o torneio mais atrativo: aumentando sua premiação e fazendo dele classificatório para eventos ainda mais importantes. Neste último aspecto, o fato do Zonal 2.4 agora ser aberto é uma pena. Também seria desejável que o Brasileiro fosse um dos critérios (mas não o único!) para formar a equipe olímpica. O sistema de classificação também poderia ser melhorado. Desde Guarulhos, 2005 o Brasileiro vem sido disputado no sistema todos contra todos com 12 participantes. Até Americana, 2009, havia uma semifinal classificatória. A partir da edição seguinte, em 2010 na mesma cidade, passou-se a um sistema de duas semifinais (divididas entre as regiões 1 - sul, sudeste e centro-oeste, e 2 - norte e nordeste). Nas edições com uma semifinal pouco menos de 7% de estreantes por edição (em média). Nas com duas, uma média de 18% de estreantes por edição com um pico de 4 em Montenegro, 2013. Nesta edição um quarto dos participantes chegaram ao Brasileiro pela primeira vez. Talvez nem seja necessário voltar a ter uma semifinal apenas, mas maior transparência no sistema de substituição e voltar a realizar a substituição exclusivamente na semifinal de origem da vaga seria um progresso. Outro aspecto da semifinal a levar-se em conta é o número de rodadas: sendo apenas sete, aumenta enormemente o grau de aleatoriedade da classificação final.
Quanto à organização e demais condições do torneio (local, hotel, etc), não posso dar uma opinião direta mas a julgar pelos post dos participantes no Facebook, tudo correu bem. A decisão da CBX de repetir o local da última edição nos leva a crer que, no geral, as condições devem ter sido acima da média. A transmissão via internet foi elogiável (é sempre bom ver o insight dum grande mestre do nível de Darcy Lima), mas deixou a desejar quanto à possibilidade de escolher uma partida para acompanhar em tempo real. Do ponto de vista da CBX, deixou a desejar a mudança da data (anteriormente estava previsto para dezembro passado) e o consequente conflito com o Festival de Florianópolis e com o Aberto do Brasil do Rio de Janeiro.
Os resultados completos e as partidas do evento podem ser conferidos no chess results.

Nenhum comentário:

Postar um comentário